terça-feira, 23 de outubro de 2012

Análise da obra Viagens na minha terra, Almeida Garrett.

De autoria de João Batista da Silva Leitão de Almeida Garrett, Viagens na minha terra, como afirmou o próprio Garret, é um livro “despropositado” e “inclassificável”, uma vez que as espécies literárias misturam-se: relato jornalístico, literatura de viagens, idílio amoroso etc. Tudo numa só obra. E é justamente essa impureza dos gêneros a principal marca deste livro. Almeida Garrett promove o ineditismo ao introduzir na literatura portuguesa “a narrativa dentro da narrativa”. Mas vale ressaltar que o seu gênero “literatura de viagem” já estava em voga. O próprio Garrett deixa claro que a sua obra é fruto do contato com esse tipo de escrita: “que viaje a roda do seu quarto quem está à beira dos Alpes (...)”. Numa clara correspondência com Voyage autour de ma Chambre, de Xavier de Maistre.
Como já citei há duas narrativas contadas numa só. Dividido em 49 capítulos, primeiramente, o livro narra a viagem verídica que o autor fez até Santarém a convite de seu amigo Passos Manuel. Não se trata de uma viagem simplesmente turística, em que somente a contemplação da beleza é descrita. Mas de um relato de viagem em que o autor tece diversos comentários sobre a situação em que Portugal se encontra, quanto a: riqueza, progresso, literatura, política, modéstia, guerra, clero, amor etc. Isso podemos perceber em passagens como: “a ciência deste século é uma grandessíssima tola. E, como tal, presunçosa e cheia de orgulho dos néscios”. “a sociedade é materialista; e a literatura que é a expressão da sociedade, é toda excessivamente e absurdamente e despropositadamente espiritualista”.
A segunda narrativa inicia quando o autor chega a Santarém e passa a contar a paixão vivenciada entre o casal de primos Carlos e Joaninha. Esse idílio amoroso merece especial atenção. Joaninha – a menina dos rouxinóis – representa perfeitamente a imagem da mulher romântica: seus olhos são verdes, é integra, pura e fiel a seu amor (Carlos). Tem apenas sua avó no mundo. Uma senhora já bastante idosa e cega. Recebe a visita, todas as sextas-feiras, de Frei Diniz. Frade franciscano que escondeu por muitos anos ser o pai de Carlos. Frei Dinis representa o velho poder do estado. Imutável as mudanças. Temos, também, Georgina, mulher que divide o amor do coração de Carlos. E por fim, temos o personagem Carlos que representa o alter ego de Almeida Garrett.
O tempo entre as duas narrativas não é linear. Entre uma e outra o autor faz diversas digressões sobre assuntos suscitados pela observação do estado atual de Portugal: desde o canto dos rouxinóis a situação política vigente. Só depois disso que Ele assume a narrativa deixada anteriormente. É um narrador-autor, em que a primeira pessoa predomina. Utiliza-se de vocativos para prender a atenção do leitor (leitora) ao enredo da obra: “leitor benévolo, leitor amigo...”. Deixa clara a recusa clássica de se fazer literatura ao deixar de lado os amiúdes das descrições clássicas: “vamos à descrição da estalagem; não pode ser clássica; seja romântica”.
Segundo Massaud Moisés (A literatura portuguesa, 2010) “o mais significativo da obra reside no idílio entre a campônia e ingênua Joaninha e o inglesado e conflitivo Carlos”. Em Carlos, percebe-se a “projeção confessional da própria vida interior de Garrett: Carlos é talvez o mais autêntico de seus alter egos”. Já Joaninha, como já disse, representa o ideal romântico de mulher. Sua relação com Carlos nos faz lembrar o fim trágico dos amores românticos que conhecemos: Joaninha ao saber que o amor que Carlos sentia por ela era dividido com outra mulher (Georgina) entristece-se e morre de desgosto. Já Georgina, não tendo o seu amor concretizado por Carlos, enclausura-se como abadessa de um convento.


O Calouro


Estava sentado ao meu lado. Calçava sandálias de pastor. A camisa estava suja de lama. E na mesma proporção, também a calça. O cabelo crescido e a barba mal feita traziam a lembrança do famigerado revolucionário argentino Ernesto Che Guevara. A fragrância do perfume já não mais exalava. No braço esquerdo duas pulseiras artesanais. E nos dedos anéis de tucumã simbolizavam a sua opção em defesa dos menos favorecidos. Era de fisionomia pequena: estatura mediana e de pouca gordura.
Ouvia atentamente as palavras de boas vindas do Reitor da Universidade Federal do Pará. Emocionava-se com cada frase pronunciada, cada vírgula pausada, cada entonação da fala. Revivia todo o caminho percorrido até a aprovação. Parecia estar sozinho naquele auditório. O seu silencio era profundo e sua seriedade imperturbável.
Antes narrara a longa jornada até o triunfo da vitória. A vida se resumia no antes e depois do seminário. De lá trouxe consigo o gosto pelas veementes homilias, o trabalho pastoral, a empatia pelos irmãos e o gosto pelo conhecimento. Nunca fora grande amante, no mais tenha vivido um ou outro amor platônico. E daí o fruto de muitos poemas românticos na adolescência.
Na medida em que os poemas surgiam, surgia também o homem intelectual. O gosto pela escrita talvez remeta a mesma idade de Cecília Meireles pelo domínio da língua e da escrita. Daí a opção pela faculdade de letras. E pelo brilho nos olhos o sonho era concretizado. Os olhos não eram dissimulados, mas instigantes. Falavam por si só. Podia-se ver neles, o reflexo perfeito de quem os viam: eram sinceros. Sincera também era a alma de quem os tinham.
O discurso do Reitor findou-se. Aquele jovem, logo desapareceu sem dar-me as considerações da despedida.
No caminho para casa, alegrava-me por dois motivos: Ter conhecido na aula magna um colega de sala. Também por saber que em muito ele se parecia comigo. E confesso sem medo de pecar que naquele momento senti inveja, quis ser o Rômulo, sem mesmo conhecê-lo mais profundamente, sem mesmo me importar com a camisa suja de lama, o cabelo crescido ou a barba mal feita. E o pior: a falta de perfume
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quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Reflexões Linguisticas


Texto 01:

Não muito tempo, o ensino da matéria de língua portuguesa estava engessado na gramática. Creio que, só depois que o professor passou a se perguntar a finalidade do estudo desta matéria para falantes nativos, é que o ensino de língua deu um grande passo. Isso graças à linguistica, que nos fez perceber que o nosso idioma não está presente somente em nosso território nacional. E se a nossa língua transita em terras do além-mar, temos então um português brasileiro. Marcado por características regionais, que nem de longe formam uma língua homogênea. Temos um mar de variações linguisticas. Variações estas cada vez mais próximas da sala de aula. Entrelaçando mais e mais no ensino de português. Rompendo o gesso da gramática normativa.
A mudança é tamanha que hoje não basta somente à decodificação da palavra, é preciso “letrar” por meio de um ensino que aceite as diversas variações.
Tais mudanças não são unanimes. Há quem prefira que a gramática normativa reine soberana em sala de aula. Já outros, até se agradem dos conceitos linguísticos. E outros ainda, adotem um ensino de língua por meio de análise linguistica. E você? 

Texto 02:

Nós fala “errado” porque nós quer. Será?
O nosso português atual não parece ser a realização espontânea de cada falante, mas o resultado do multilinguismo que nos formou. Herdamos desde termos da culinária africana (vatapá, feijoada...) a expressões atuais oriundas da terra do Tio San: Ex May Love, se botar teu amor na vitrine, ele nem vai valer R$1,99. Passamos por várias “torres de babel”, em que a heterogeneidade linguística não foi o fim, e sim o começo: o português que conhecemos. Isso nos fez diferentes de nossos irmãos lusitanos: nas variações linguisticas, no sistema fonológico, e até mesmo na significação das palavras. Um amazonas de variações (diacrônica, diatópica, mercado de trabalho, grupo social). Lembro-me de um balneário em alter-do-chão, que no início chamava-se “vamos em boa hora”depois “vambora”, “embora” até se chamar “boralá”. Ou ainda, quem de vós pegou uma “bicha” hoje? Mas não basta só sabermos o processo. É preciso tornar útil o conhecimento. E a grande questão hoje é se há a possibilidade de casamento entre a gramática e a linguística. Ou se o divórcio é eminente. Muitos torcem pela relação matrimonial. Outros nem querem que o namoro comece. O fato é: só a gramática não é capaz de formar escritores/leitores competentes. A fórmula até parece óbvia: só se aprende a ler, lendo. Só se aprende a escrever escrevendo. Antes da ortografia vem o pensamento, o encadeamento das ideias, a organização do texto ainda inédito. Aí nos perguntamos: é possível essa nova concepção de ensino de língua? O que é melhor: saber o “certo”, mas falar errado porque nós quer? Saber o “certo e o errado” e usar o que acharmos melhor?

Resumo do livro Preconceito Linguístico: o que é, como se faz


BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 54ed. São Paulo: Edições Loyola, 2011.

Existe uma série de (pré) conceitos relacionados ao português falado no Brasil, julgando-o desde um idioma muito difícil de ser aprendido, inclusive pelo próprio falante materno, a uma língua homogênea num território de mais de 190 milhões de falantes. Com o objetivo de desconstruir pensamentos como esses é que Marcos Bagno desmistifica oito principais mitos de uma mitologia do preconceito linguístico. A saber: Mito n° 1: “O português do Brasil apresenta uma unidade surpreendente. A afirmação sacramentada por muitos, crê numa fala homogênea em que ela seja comum a mais de 190 milhões de brasileiros. Esse pensamento exclui diversos fatores linguísticos e extralinguísticos responsáveis pela heterogeneidade que o português brasileiro assume. Mito n°2: “O brasileiro não sabe português/ Só em Portugal se fala bem português. Esse mito reflete um complexo de inferioridade de um povo que traz consigo as marcas da colonização em que a própria língua é subjugada inferior em relação à língua do país colonizador. Chegando ao absurdo de dizer que o próprio falante, embora materno, não saiba seu próprio idioma por não utilizá-lo tal quais seus irmãos lusitanos. Mito n°3: “Português é muito difícil”. Essa ideia só corrobora o mito anterior de que “brasileiro não sabe a sua própria língua”. Na verdade, confunde-se a o uso da língua com o estudo da gramática baseada em normas gramaticais literárias de Portugal. Por isso, que esse mito ainda ganha teor de verdade, uma vez que a dificuldade se encontra nas inúmeras regras gramaticais, muitas das quais, desvinculadas do uso real da língua. Mito n°4: “As pessoas sem instrução falam tudo errado”. Esse pensamento crê na tríade escola-gramática-dicionário como o único caminho possível para a iluminação no uso correto da língua portuguesa. Logo, as pessoas menos escolarizadas, ou que não passem pelo caminho já citado, têm a sua manifestação linguística considerada como errada, feia, estropiada, rudimentar, deficiente. Mito n°5) “O lugar onde melhor se fala português no Brasil é o Maranhão”. Esse mito tenta se auto justificar tomando por base o fato de no Maranhão usar-se com certa regularidade o pronome “tu”, marcação especifica verbal da segunda pessoa. Mas o mesmo falante por vez esquece-se desse arcaísmo e realiza construções em que o “tu” é substituído por “ti” assumindo a mesma forma do pronome “mim” posposto da preposição para, anteposto de verbo no infinitivo. Mito n°6) “O certo é falar assim porque se escreve assim”. Esse mito logo cai por terra, pois, em nenhuma língua do mundo fala e escrita se equivalem. A escrita surgiu como uma tentativa de representação da fala. Além do que, muitos sons não podem ser diferenciados na fala como o “u” e “l” finais. Mito n°7: “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”. Esse mito é facilmente desmistificado, pois, se é preciso saber gramática para falar e principalmente escrever bem, nossos grandes escritores teriam seus rótulos de “imortais” cassados por inabilidade gramatical, já que muitos desses declararam desconhecer o âmago das regras e exceções gramaticais. Mito n°8: “O domínio da norma-padrão é um instrumento de ascensão social”. Se essa ideia de fato fosse verdadeira, os professores de língua portuguesa estariam no topo da pirâmide social. Pois quem além deles tem relação tão íntima com o idioma. Por outro lado, a falta de domínio da norma-padrão não é fator condenatório a exclusão social. Trabalhadores aquém dessa variedade linguistica, também, podem ascendem socialmente.
Terminado os mitos, ainda é discorrido “o circulo vicioso que o preconceito linguístico assume” percorrendo desde os livros didáticos, gramáticos e suas gramáticas normativistas até programas de TV’s com seus quadros em que o português é paciente agonizante a espera de medicação. Seguindo o raciocínio, é apresentada “a desconstrução do preconceito linguístico”, em que, primeiramente, é preciso reconhecer a crise pela qual o ensino de língua está passando. Depois, adotar uma mudança de atitude refletindo sobre questões como: o que é ensinar português? O que é erro? Tudo vale na língua? O que é mais importante em um texto: os “erros” ortográficos ou o encadeamento lógico das ideias?
Por fim, “o preconceito contra a linguística e os linguistas” é debatido, inicialmente, atestando a ciência da linguagem uma importância muito grande. Pois, mesmo antes do cristianismo essa ciência já era estudada. Em seguida, há reflexões sobre o “português ortodoxo”, “devaneios de idiotas e ociosos” e por último: “a quem interessa calar os linguistas”?

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Eu não sou padre. Eu sou professor!


Por muitos anos a figura do professor foi vista como a pessoa do jovem vocacionado ao sacerdócio. Como se o exercício da licenciatura fosse uma dádiva de Deus agraciada a poucos postulantes. Mas nem mesmo o exercício de padre e, nem tampouco o ato de ser professor é algo divino, e sim, uma competência profissional que requer muita formação, informação e dedicação.
Atualmente, para o nosso bem, o véu que nos transfigurava em “Eli” vem sendo descortinado. Cada vez mais a sociedade percebe que ser Professor é uma profissão tão importante quanto qualquer outra. Aliás, a profissão mais importante, uma vez que o professor forma todos os demais profissionais. Mas nem por isso somos sacerdotes. E por falar em sacerdotes – Padres – estes não trabalham por caridade (excluindo-se pequenas exceções). Muitos chegam a ganhar bem mais que um professor. Mas para isso, estudam durante muitos anos: formam-se, informam-se, leem bastante e dedicam-se ao máximo até chegar ao comando da paróquia. Já nós professores, por maior o amor que tenhamos em lecionar, nem por isso, lecionaremos de graça. Precisamos ser valorizados (salarialmente). Antes de tudo, precisamos nos valorizar: levar mais a sério a nossa formação acadêmica, deixar nossos pedidos da AVON, NATURA, HERMES e quantas revistas mais, para serem feitos em casa; sacrificar algumas madrugadas em busca do conhecimento próprio (o conhecimento é que diferencia os professores); ser exemplo de família, de comunidade e de agente educador na escola.
Por fim, não somos padres. Somos professores. “O padre decora a missa. O professor, jamais poderá decorar o ritmo de suas aulas”.

domingo, 14 de outubro de 2012

Como fazer um bom resumo


imagem da internet
Muitos alunos pensam que para fazer um resumo basta grifar as partes consideradas mais importantes de um texto e transcrevê-las. Não é bem assim, caro leitor. Se você considerar “resumir” apenas isso, você estará fazendo o que Platão & Fiorin (Para entender o texto, pg420, 2003) chamam de “colagem” de fragmentos. Então como se faz um resumo? Pergunta o leitor ansioso.
Ainda segundo Platão & Fiorin, resumir um texto significa reduzi-lo ao seu esqueleto essencial sem perder de vista três elementos:
a)   Cada uma das partes essências do texto;
b)   A progressão em que elas se sucedem;
c)   A correlação que o texto estabelece entre cada uma das partes;
Alem desses três elementos, a pessoa que se propõe a resumir deve ter grande domínio de leitura e interpretação (para saber captar as ideias chaves) e poder de concisão do texto escrito.
Mas como fazer isso?
a)   O primeiro passo é a leitura integral do texto a ser resumido. Nessa leitura dispensam-se as marcações das ideias e anotações. O objetivo é ter a compreensão total do texto e isso não pode ser feito em pedaços.
b)   O segundo passo é a leitura atenta do texto. Agora se faz necessário as marcações e anotações por parte de quem resume. Essa leitura não é para captar o que o texto pode dizer (isso já foi feito no primeiro passo), mas para retomar ideias já compreendidas.
c)   Num terceiro passo é hora de fazer o seu próprio texto. Isso mesmo: o seu próprio texto! Essa é a característica principal do resumo. Você deverá construir um texto com as suas próprias palavras sem deixar de lado a fidelidade com o texto original. Para isso você deve possuir um vasto repertório linguístico. Lembre-se de que o seu texto deverá seguir a mesma sequência lógica do encadeamento das ideias do texto original.
É claro que dependendo do seu grau de leitura/interpretação e do nível de dificuldade do texto a ser resumido você poderá pular etapas. Mas nunca se esqueça de que resumir compreende a sua capacidade de contar o que você leu. É como se você assistisse a um filme e depois contasse a um colega de maneira concisa, enxuta, curta sem que a compreensão fique comprometida. Sempre gosto de resumir, após as etapas citadas, deixando de lado o livro (texto) em questão, recorrendo a ele apenas para assimilar melhor uma ideia ou outra.